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Capítulo - 6

Na travessia do Desespero

Fernanda estava com tanto medo que nem percebeu que já estava indo para a parte norte da cidade, entrou em um beco com ondulações engraçadas, a parede esburacada acabou por atrair a adolescente, quando percebeu já estava perdida. O desespero começou a tomar conta de Fernanda, que se sentou e chorou por quase uma hora, eu tentei caro leitor, acariciar sua cabeça, mas ela não sentia minha presença, tentei sussurrar em seu ouvido que eu estava lá com ela e só por ela, mas ela não me escutava. Ai sem que percebesse chorei com ela, nunca tinha sentido o gosto de uma lágrima nos meus lábios, aquele gosto estava fazendo com que eu não quisesse mais cumprir o meu trabalho, eu sentia que a hora estava próxima, podia sentir em meu intimo que quando caísse a primeira gota de sangue do meu nariz o sopro de sua respiração iria se igualar ao nada! Zero!!!
De repente uma sombra me cobriu, um leve som foi pronunciado...
-Oi, tudo bem? Sou Caleu. Um sorriso se começou a forma nos lábios de Fernanda quando seus olhos de avelã se cruzaram com os olhos azuis oceano do garoto alto, de cabelos cor de ouro.
Ele com um leve sorriso demonstrou achar graça e lhe falou:
- Como uma menina tão linda e com cara de boneca está em beco úmido e frio na parte norte da cidade?
- É uma longa história.
- Eu tenho muito tempo!
- Acho que não vai querer escutar. Posso te fazer uma pergunta? Fernanda o olhava com um misto de aflição e confusão.
- Claro que sim.
- Você mora na rua? É que não se parece com os outros garotos de favela.
- Eu também tenho uma longa história.
- Eu também tenho muito tempo.
Com um gesto de aceno o convidou a se sentar, me obrigando a ter que me retirar do meu lugar, um silêncio se alastrou no beco por alguns segundos, até que ela disse que estava triste com a vida, que não via mais sentido em viver. Era estranho ver como o ser humano se relacionava rápido, sem as vezes perceber o perigo.
Caleu e Fernanda ficaram se olhando enquanto as nuvens passavam pelo céu do fim de tarde. Ele a convidou a tomar um lanche, pela fome que sentia ela não se atreveu a recusar. Os dois continuaram seguindo pelos becos, ate chegar em uma pequena mercearia no morro da favela. Eles comeram no silêncio, Caleu se encantava com os grandes olhos da menina a devorar o lanche, com a respiração ofegante e os cachos do cabelo a refletirem nos raios sol que entrevam pelas frestas da parede mal construída.
Em um gesto impensado ele passou a mão sobre a face dela, para arrumar uma mecha de cabelo que caia sobre a testa, com um sorriso infantil ela passou a mão sobre os lábios sujos de molho.
Os dois sorriam um para o outro, como se já se conhecessem há anos e tivessem muita intimidade. Quando eles saíram da mercearia Caleu falou:
- Fernanda você tem onde dormi essa noite?
-Não.
Ela baixou o rosto com certa vergonha de estar tão vulnerável. Eu sentia grande inveja do garoto, ele conseguiu extrair uma emoção de vergonha daquela menina que eu estava a tempo tentando conquistar. Ele a convidou para dormi em sua casa.
- Você gostaria de dormi lá?
- Acho melhor não, nem te conheço direito. Quem me garante que você não é um louco.
- Eu tenho cara de louco?
- Não, mas louco não tem cara...
- Eu juro que não vou fazer nada com você, pode ate dormi com a porta fechada se quiser!
- Tá eu aceito, mas pela manhã vou embora.
-Claro.
Os dois subiram o fim do morro, chegando a um barraco velho e todo esburacado. Onde se sentaram em um sofá furado, que possuía um cheiro de mofo misturado a umidade da casa. Com um grande sorriso, ele falou:
- Bem vinda ao meu palácio.
Ela olhou em volta e voltou os olhos para ele pensando se ele era doido, mas seu coração já avisava em uma futura paixão.
- Acho que a soda lhe fez mal.
Risos ecoaram pelo pequeno barraco, risos de inocência. Exceto os meus que queria que a afirmação de Fernanda fosse verdade.
- Vou pegar umas roupas para você, essa sua está muito suja.
Fernanda se perguntava o que um rapaz tão bonito fazia ali, em meio aquele lugar asqueroso. Eu sabia a resposta, mas a guardei só pra mim.
Depois dela ter se trocado no quarto dele, os dois começaram a conversar em quanto assistiam a um filme na T.V, ela começou a falar como os dois eram parecidos, o rosto, o formato dos olhos e até a manchinha que ela tinha no pulso direito, ele também possuía.
- Onde está sua família Caleu?
- Tai uma coisa que eu não sei, nunca conheci ninguém da minha família, eu não tenho mãe, mas a mulher que cuidava de mim morreu há dois anos, levou uma bala perdida.
- Desculpe, não queria tocar no assunto dessa forma.
- Não, tudo bem, não me importo se a vádia da minha mãe não me quis, eu não ligo. Só agradeço pela dona Sandra ter cuidado de mim, ela nunca mentiu pra mim e contou que me achou em uma caixa na entrada do morro, perto do beco que você estava, sozinho chorando sem ninguém para cuidar, frágil e indefeso. Ela me contou que eu chorava muito e tinha os cílios mais lindos que ela já vira, que quando a vi parei de chorar. Ai ela pegou e resolveu cuidar de mim.
- Elas que escolheu seu nome?
- Não estava no papel, que dizia que meu nome era Caleu, ai ela gostou e manteve. Dona Sandra quis fazer a vontade da minha mãe, me registrando como Caleu Diniz Cortez.
- Nome lindo.
- Obrigado Fernanda...
- Meu nome é Fernanda dos Anjos Querubim Almeida.
- Seu nome também é diferente.
Com os olhos receosos os dois ficaram a fitar um ao outro, até que Caleu se aproximou de Fernanda para beijá-la, eu tentei empurra-lo, mas minhas mãos atravessaram seu corpo. Sorte que ela o empurrou e disse que não podia. Fiz caretas para ele, ouve um momento que ele olhos com raiva o canto do sofá onde eu estava, cheguei a pensar que ele tinha me visto.
- Por que Feh?
- Disse que não tentaria nada, lembra?
Isso era inaceitável, quem ele pensava que era para chamá-la de Feh, e tentar beijá-la?! Se eu pode-se levaria ele em vez dela, só por sua audácia. Mas ainda era cedo para ele.
- Então você mora sozinho aqui?
- Sim.
- Hum, engraçado termos o mesmo sinal no pulso não é?
- Acho estranho, não engraçado.
A noite seguiu, até que os dois adormeceram no sofá esburacado. Pelas 04h 15min da manhã Caleu se levantou e cobriu Fernanda com uma manta. Confesso que esse gesto dele ate que me suou agradável. Mas não fui com a cara dele.
Pela manhã tentei sussurrar no ouvido de Fernanda, apara darmos o fora dali, mas para variar ela não me escutava, eu queria muito que ela saísse ilesa dessa história toda, embora meus anos de experiência me dissessem que isso não aconteceria.
Quando ela acordou ele tinha lhe preparado um café da manhã modesto, eu sabia que ele tinha como desejo conquista-la, mas isso não podia acontecer.
Ela retribuiu com sorriso, e foi ao pequeno banheiro lavar o rosto.
Os dois se sentaram e comeram...
- Então você já vai embora mesmo?
- Já está me expulsando?
- Não, de forma alguma pode ficar o quanto quiser.
- Fala sério?
- É bom ter companhia, além do mais bonita como você.
- Eu não tenho para onde ir, e não quero voltar para casa.
- Então estamos entendidos, você fica!
- Eu aceito.

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